terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Anorexia: Um drama no século 21


Obsessão pela magreza. Sinônimo de beleza para alguns. Transtorno alimentar imposto inconscientemente por padrões estéticos para outros. Diga-se de passagem, cada vez mais outros. Os sintomas deste distúrbio, que intriga seus conhecedores atualmente, merecem uma maior divulgação. Assim, as histórias de suas vítimas fatais continuam chocando a população, principalmente nas noites de domingo, naqueles programas conhecidos como “revista eletrônica”. Na maioria das ocasiões, tamanho o alarde social, a reportagem especial abre a atração. Pois bem, a anorexia assola uma, cada vez mais, relevante parcela da população ao redor do mundo. O que cabe a nós?

Vivemos em uma sociedade onde o culto excessivo ao corpo é concomitante à indústria da moda e dos padrões a serem, absurdamente, seguidos. Nesses casos, a perda e a preocupação excessiva em relação ao peso são encaradas, por alguns, como necessidade vital para serem integrantes em certos meios. Relacionado a isso, devido a constante preocupação com o peso e a pressão sofrida, profissões como jóquei, bailarina e atletas olímpicos são considerados de risco para a anorexia.

No entanto, essa padronização global (na moda, na estética e, em alguns casos, no esporte) está longe de ser o único bicho papão da história. Especialistas no assunto afirmam em discussões, debates e fóruns, que aspectos psicológicos, comportamentais e familiares encabeçam a lista dos motivos pelos quais algumas pessoas desenvolvem o problema. Deixando de lado algumas explicações mirabolantes, neste caso, a Psicologia indica que ocorre a interação desses fatores.

Constantemente, somos “abastecidos” com as fatalidades ocorridas, que fazem vítimas. Exemplos não nos faltam. Nos diversos noticiários espalhados por toda a mídia, invariavelmente, vem à tona algumas chamadas: “Morre modelo vítima de anorexia em...”, “Anorexia faz outra vítima. Desta vez...”. E por aí seguimos.

Mas não só das desgraças alheias vive a imprensa. Sua natureza também é informar a opinião pública - carente de informações. É o que pudemos acompanhar no concurso “Menina Fantástica”, em 2009. Onde a toda poderosa Rede Globo preocupou-se em oferecer acompanhamento de profissionais da Psicologia e da Endocrinologia às aspirantes a modelo.

Subsidiados no que vemos, ouvimos e acompanhamos, podemos afirmar que muitos tentam alcançar a façanha de perder peso a qualquer preço. As indicações são de que a incessante busca pelo corpo perfeito resume uma evidente irracionalidade. E não pára por aí. De origem multifatorial – onde inúmeros fatores envolvem o problema -, a anorexia, que segundo pesquisas tem início médio aos 17 anos, pode ser acompanhada por um outro transtorno alimentar: a bulimia. Suas vítimas apoiam-se no uso abusivo de remédios para emagrecer, laxantes, diuréticos, até chegar à greve de fome. Em alguns casos, a morte ocorre por inanição, suicídio ou desequilíbrio na perda de líquidos pelo corpo.

Teoricamente, muitas pessoas creem que esse problema seja uma exclusividade feminina. Ledo engano. Para tanto, em 2006, o Hospital das Clínicas (HC) - que possui o maior centro e a única enfermaria especializada na América Latina - passou a tratar da anorexia em homens. Atualmente, esse nicho representa 10% do total de pacientes deste problema.

Especialistas do HC afirmam que o padrão de beleza imposto é uma das razões para o fenômeno e não há medicação específica para o problema. Para eles, o uso de antidepressivos ajuda a atenuar sintomas depressivos, compulsivos e de ansiedade. Geralmente, o tratamento de pacientes anoréxicos exige o trabalho de equipe multidisciplinar. Indispensável para uma boa reabilitação, a reintrodução dos alimentos deve ser gradativa, para evitar uma sobrecarga cardíaca.

No que tange à prevenção ao distúrbio, a célebre frase “Nunca é tarde para começar” resume basicamente o trabalho instituído e desenvolvido por alguns grupos e associações ao redor do planeta, sobretudo entre as jovens candidatas a modelo. No Brasil, a contínua preocupação com a anorexia é colocada em xeque no maior evento da moda tupiniquim: o São Paulo Fashion Week (SPFW).

Em 2006, a Associação Brasileira de Psiquiatria colaborou com a coordenação do evento a elaboração de um programa para o acompanhamento e prevenção à anorexia. Em contrapartida, o projeto para a construção de um centro contra distúrbios alimentares, planejado entre a SPFW e a Universidade de São Paulo, ainda não saiu do papel.

Cabe a nós, não permitir aos nossos jovens que conceitos antiquados de beleza e elegância sejam inseridos em suas vidas. Sempre alerta, como tem que ser, a família certamente será um poderoso “escudo”, tal qual uma defesa intransponível de um grande time de futebol no combate a esse poderoso ataque, que teima fazer com que certas vidas abdiquem-se em vão.


* Texto publicado em 2009, na edição 25 da revista Mais Destaque.

Tadeu L. Inácio

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Pedofilia. Uma infantil crueldade


A guerra parece estar no início. Políticas de governo, CPI, Organizações e a postura da sociedade na labuta para pulverizar tal brutalidade

Que alguns crimes nos causam desconforto, repugnância, sensação em estar de mãos atadas, entre outras sensações, não é nenhuma surpresa. No entanto, poucos delitos conseguem ferir nossa honra, como a pedofilia. Tamanha a repercussão negativa e alarde social que estes fatos carregam, tais notícias requerem um cuidado todo especial, sobretudo por parte da mídia, na divulgação dos fatos. Nestes casos, a intervenção do governo federal, em todas as suas esferas, faz-se necessária.

De antemão, é preciso compreender bem o assunto e tudo o que ele envolve. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a pedofilia é definida, simultaneamente, como doença, distúrbio psicológico e desvio sexual. Nos manuais de comportamento e classificação de transtornos mentais, encontramos essa categoria diagnóstica. Especialistas no assunto afirmam que o simples desejo sexual, independente da realização do ato, já é caracterizado como pedofilia. Não é preciso que ocorra relação sexual para haver o crime.

É evidente que a velocidade no crescimento e participação de seus apreciadores cresce paralelamente à agilidade da Internet, que, por sinal, atualmente, segundo especialistas, é o principal canal de divulgação do crime. Devido a isso, a pedofilia é capaz de movimentar milhões de dólares ao redor do planeta. As pornografias fomentam o turismo sexual, já reconhecido mundialmente em terras tupiniquins. Isso comprova os dados registrados pela Polícia Federal, que apontam o Brasil como a quarta nação no ranking de consumo de pedofilia em todo o mundo.

Ao pesquisar o tema, obtive a informação que, na legislação brasileira, não há um crime intitulado “pedofilia”. O que existe são algumas definições e enquadramentos, variando conforme o caso. Certo ou errado, isto consiste em um fato. Os seres (se é que podemos nomeá-los assim) que cometem o abuso são enquadrados em atentado violento ao pudor; estupro; e pornografia infantil. O que poucos sabem é que apenas os menores de 14 anos são considerados vítimas do crime.

Volta e meia somos pegos de surpresa com barbáries dessa estirpe. Há poucos meses, um deles em especial, chocou o País. Suspeito de abusar de duas enteadas – duas crianças, uma de nove e outra de 14 anos -, um homem foi detido em Alagoinha (PE). Inclusive, tal violência doméstica tomou proporções maiores devido à gravidez, de gêmeos, da menina mais nova. Na mesma página desta notícia, em um confiável site, encontrei outros links, no ícone “Notícias Relacionadas”. E as barbáries seguem em Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina...

A batalha contra brutalidades como esta não está perdida. Certamente, existem algumas etapas a percorrer. Uma delas é a conscientização dos jovens na nossa própria casa e na vizinhança em que habitamos, sobretudo nas relações interpessoais e no uso dos computadores.

Cada vez mais é comum o domínio destas máquinas por parte de muitas crianças e, por consequência, o alcance imediato a todas as “maravilhas” que elas oferecem. O acesso a blogs, chats e sites de relacionamento são otimizados a cada click. O absurdo chega a ponto da existência de clubes, ou seja, grupos de pessoas interessadas no consumo, de maneira incólume, dessas barbáries. Não é à toa que as campanhas de combate à pedofilia, espalhadas por toda a rede mundial de computadores, crescem a cada ano. Na IASD, por exemplo, existe o projeto “Quebrando o silêncio” (leia a seguir), que, além de abordar as variadas formas de violências ante crianças, enfatiza a importância em denunciar.

No que tange à política, o País parece estar disposto a sanar ou atenuar, gradativamente, os casos. A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pedofilia foi criada em março de 2008, por iniciativa do senador Magno Malta (PR-ES), escolhido para presidi-la. Nove meses depois, em dezembro, a CPI conquistou um resultado positivo: a sanção de um Projeto de Lei, de autoria deste senador, aprovado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que aumentou consideravelmente a punição e abrangência de crimes relacionados à pedofilia na Internet.

Segundo informações obtidas por meio da assessoria do senador Magno Malta, o primeiro avanço nesta CPI, antes mesmo da sanção ao projeto, foi a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o Ministério Público Federal e a Google do Brasil (mantenedora do site de relacionamentos Orkut, utilizado por pedófilos na troca de informações). No acordo, a Google deve encaminhar à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal os dados sobre pedofilia de usuários do Orkut e guardar estas informações por seis meses. Uma importante parceira dos trabalhos realizados pela CPI da Pedofilia e autoridades brasileiras é a Microsoft, responsável por criar novas ferramentas de combate a crimes on-line que envolvam crianças e adolescentes.

Para Magno Malta, a comissão é responsável por investigar a rede de pedófilos existente no país, inclusive com a disposição de expedir mandados de prisão de criminosos já investigados pela polícia. "Recebi essa missão com muito orgulho e entusiasmo. É degradante e assustador o quadro que registramos hoje no País. São processos inacabados e denúncias que param no meio do caminho", disse.

O trabalho político também é desenvolvido na capital paulista. No início de março deste ano, a Câmara Municipal de São Paulo instalou uma comissão para debater o assunto: a CPI da Pedofilia e do Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-Juvenil. Reuniões, presididas pelo vereador Marcelo Aguiar (PSC), já ocorreram. Aos vereadores, foram apresentados dados do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas (ILANUD), que atestam ser as próprias residências, os locais mais propensos para o abuso sexual infantil (26,95%), seguido pela Internet (24,85%).

A iniciativa e o trabalho desenvolvido na CPI paulista vem sendo elogiado por algumas autoridades. Durante uma reunião na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em abril, o presidente da Ordem em São Paulo, Luiz Flávio Borges D´Urso, declarou apoio incondicional no combate ao abuso sexual infantil. Na oportunidade, ele parabenizou a Comissão. “A CPI da Pedofilia tem feito um trabalho muito grande não só de conscientização, mas de reação contra esse grave mal que assola ainda, parte da nossa sociedade”, afirmou.

Por fim, o desafio também está em nossas mãos. O governo deu o pontapé inicial e começa um processo que, certamente, surtirá efeitos na sociedade em um médio prazo. E todos nós devemos corroborar para a salvação (física e psicológica) de milhares de (iminentes) vítimas, espalhadas ao redor do planeta. A prevenção é a melhor armadura contra este crime.

* matéria publicada na edição 26 da revista Mais Destaque, em 2009

Tadeu L. Inácio